domingo, 11 de setembro de 2011

Bandaids e pipas.


Obrigada pai, por me ensinar a pisar com os pés descalços.




"Coleções servem pra juntar pó” disse o pai da menina. A menina colecionava bandaids. De todos os formatos, cores, tamanhos. Tinha de bolinhas, de coruja, de listras verdes e vermelhas. “Para estancar todos os tipos de dor” dizia.

Menina tinha os pés de fora, pisava descalça em gramados verdes, corria sobre areias quentes até levantar a maior tempestade do maior deserto que existe no mundo. Menina nadava como se peixes precisassem aprender. Construía castelos imensos de areia. Todos os dias! “Pra nunca enjoar, pra sempre morar em um lugar diferente”. Papai olhava menina preocupado com um futuro que era só amanhã. "Não perca minha filha disso tudo o chão que te falta aos pés". “É só amanhã papai!!!”

"Amanhã já chegou minha filha querida”. E como num anoitecer acelerado, manhã fez-se orvalhada e fria. Menina de cabelos longos, fechava o sapato como quem fecha um ciclo. Menina saiu de cabelos amarrados (já não sentia o vento de vendaval no rosto queimado levemente pelo sol), pasta sob o suvaco (o mesmo que sentia as cócegas exageradas do pai), chave do carro nas mãos ( não subia mais até a lua, carruagem que a levaria até a porta do castelo daquele dia).

Menina cresceu.

A coleção de bandaids agora tinha como morada uma latinha velha e enferrujada com pipas coloridas na tampa. A caixinha cheia de pó pousava nas mãos envelhecidas do pai. Menina olhava o relógio, desesperada tentava segurar um pouco mais o tempo. “Atrasada, tenho reunião” “Por que a pressa? Fica hoje minha filha” "Não posso” ela dizia. E nunca podia.

Beijo na testa e um "se cuida" cheio de perfume. Pai ouvia “Blowin ‘In the wind” , velha música do Bob Dylan. Segurava a velha caixinha. Olhava a coleção como quem vê um velho album de retratos. Pai derrama sobre o bandaid de flores azuis seu ultimo suspiro e leva consigo tudo o que era a menina. De carruagem sobe a rampa do castelo. Pisa na grama, solta uma pipa e sai voando com os peixes. Sobrevoa o escritório (cela) da menina. Joga da caixinha todos os bandaids (pra estancar a dor, lembra?). Grita: “Urrul, puta que o pariu”.

Chove. Menina ri. Menina segura com a ponta dos dedos o bandaid de flores azuis. Menina chora.

6 comentários:

Juliana disse...

Adoro ler seus textos, Paulinha. Escreve com uma sensibilidade incrível. Parabéns!

Ná Oliverio disse...

Muito lindo o texto. Parabéns!!!!!!!!
Beijos

Gabi disse...

Com certeza esse fano esta sendo incrivelll :)
Bjs amoree

Anônimo disse...

Amo ler teus textos, Paula! Sinto-me muito bem! São simples e encantadores! Envolvem a alma, fazendo-a caminhar e dançar em teus pensamentos.
Não nos deixe sedentos da tua poesia!

Anônimo disse...

Saudade dos seus textos...
Beijo Paulinha!

Clara disse...

Oi Paula, me emociono com a sensibilidade dos seus texto, você deveria escrever mais! Um beijo!