domingo, 31 de maio de 2009

A Outra Parte.





Pronta para saltar ao primeiro gesto. Por um momento fecha os olhos e ouve: música e silêncio maiores do que palavras podem dizer no ato de um precipício. Até que, num gesto súbito e natural, ele lhe aperta o braço. Já está nua e sente mais que cheiro e calor, mais que beijo e pele. Sente sem saber explicar, como se fosse apenas estar ali, dentre bananeiras, precipício e rua movimentada. Sente o assombro da pedra desmontando embaixo dos pés descalços, a mão que a segura firme pelos cabelos e a voz que lhe sussurra no ouvido esquerdo. Ela estica um pouco o pescoço para que exale também seu cheiro. Ouve: “Te atira”. “Me solta então, me deixa”. “Medo de que te arrependas, que te transformes após a queda”. “Me deixa o medo é meu e me sinto livre”, “te entrega”, “me solta”, “te atira”, “me permite então”, “voa”, “seguras a minha mão com teus braços longos, mas solta o meu cabelo pra que eu possa, com o vento, nua, solta, livre, sem nenhuma carcaça, asas cortadas de borboleta semi-morta, me atirar, desmedida”. “Por quê”? “Eu preciso”. “Por que?” “Quero gritar” “Grita!”, “me deixa, eu me atiro”.

Ele a solta. Olhos nos olhos “até breve”. Volta ainda pela necessidade de um último abraço, beijo contido, “eu te amo”, pensa, e se atira, linda, braços abertos, plena sem saber voar.